quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Escola de Teatro

Pelos momentos mais estranhos, inusitados e engraçados que pude presenciar e por uma ótima amizade, dedico esta crônica a um dos meus melhores amigos, L. P.
     Tive dificuldade de escrever uma crônica em que L.P. e eu fossemos os protagonistas. O problema não está na quantidade de experiências, que na verdade é enorme, mas sim no nível de cada uma delas. Tem certas histórias que devem ser mantidas entre amigos e raramente reveladas, como qualquer outro bom amigo faria (ou não ;D). Já outras, podem ser reveladas e apreciadas, como acho que é o caso da crônica abaixo.
     Algum tempo atrás, tínhamos aula à tarde e geralmente nos encontrávamos de manha na biblioteca do colégio para estudar. Ou melhor, tentar estudar e às vezes nem tentar. Era frequente a biblioteca ficar vazia, contudo nesse dia, em uma das mesas estava alguém que conseguiu desviar totalmente nossa atenção, principalmente a atenção de L.P.
- Cara, eu preciso chamar a atenção dela. Cansei de ser ignorado... nem olha pra cá !!!
- Uai cara e você quer fazer o que ? Levantar da cadeira e gritar: Ei !!! Eu to aqui !? Ela mal fala com você !! Se fizer isso vai é assustá-la !!
- Bem, pelo menos ela vai ter olhado pra cá, e não vai correr de qualquer um, mas sim de mim.
- Hahahahahahaha. Tem que ser natural. Chegar na mesa dela e simplesmente falar um “Oi !”, não vai fazer ela ter medo de você.
- Ela tá naquela mesa há muito tempo. Tinha que ter cumprimentado ela quando chegou.
- Uai, faz de conta que tá com dúvida em alguma matéria.
- É isso!!! Cara você é um gênio!!!
     Fiquei meio assustado. Era, e ainda é, frequente ele dizer isso, e o que sempre vem depois é uma ideia nada convencional.
- Faz de conta!! Encenação! Teatro! É isso que vamos fazer!
- Teatro?? Hahahahaha, você ficou maluco? Nós? Fazendo um teatro pra tentar chamar a atenção de uma garota? Cara, isso é ridículo!! Hahahaha
- Vamos fingir uma briga aqui. – disse ele ignorando totalmente o que eu disse e pensando em como iria ser.
- Uma briga?
- É cara, preciso de ajuda.
     Fiquei meio irritado e resolvi entrar na suposta encenação para acabar logo com isso. Já fui começando a briga com voz suficientemente alta ao ponto das outras mesas escutarem:
- Quem você pensa que é ao ponto de não fazer o trabalho?
- Eu sou o líder do grupo, seu f*d*p* - disse L.P. percebendo que eu já tinha começado a encenar.
- Então faz o seguinte. Pega essa m**** de trabalho e faz você. Sozinho!! Além do mais eu já passei de ano mesmo. Não preciso de 20 pontos pra passar!!!
- E se eu não quiser?
- Engole!!!
     Ao dizer isso me virei e fui biblioteca afora, tentando manter a irritação em meio a vontade de rir. Logo após de eu ter saído L.P. também saiu e disse o seguinte:
- Cara eu acho que elas olharam, hahahahaha
- Você acha? Mas nem pra olhar pra cara delas para confirmar se deu certo ?
- Ah, vergonha né cara?
- Hahahahaha, e agora vey? Com que cara que a gente vai voltar pra lá? Pq meus materiais ficaram lá e não dá pra gente voltar fingindo que nada aconteceu.
- Eu vou voltar primeiro. Quando você voltar, faz de conta que tá pedindo desculpas. Não precisa ser em voz alta, só mostrar que apertamos as mãos e tá tudo certo.
     Dito e feito. Sentei-me, pedi desculpas e visivelmente o cumprimentei. E logo depois de costas para a suposta mesa, rimos tudo o que tínhamos direito e concluímos que não possuíamos absolutamente nenhum senso de ridículo.
     Hoje em dia essa é apenas mais uma dentre tantas outras histórias, que, com toda certeza dificilmente serão esquecidas. Já entrando na faculdade, L.P. terá agora que ir para longe de alguns membros da família e dos amigos para garantir seu futuro, contudo sinto que esse é apenas o começo do começo de várias outras histórias ridículas e estranhas só possíveis com este bom e velho amigo que soube ser companheiro por todo esse tempo.
     E o que aprendi com isso tudo? Bem quando a vida pedir um pouco de improviso irei ter o orgulho de usar a sabedoria adquirida na “Escola de Teatro L.P.”: Se nada der certo, faça um teatro.

quarta-feira, 14 de março de 2012

A palestra de Herbie

    -E ai Bernardo? O que você não gosta de fazer? Tipo, o que você mais odeia?
    -Por mais incrível que possa parecer, eu odeio viajar...
    -Viajar??!! Mas viajar é a melhor coisa que existe!!!
    -Não com o meu pai...
    Viajar com o meu pai sempre foi sinônimo de desastres. Meu irmão, eu e minha mãe tínhamos que nos preparar psicologicamente e fisicamente antes de qualquer viajem na qual o meu pai estivesse no controle da direção, pois sua impaciência, imprudência e irresponsabilidade nos traziam muita insegurança e a certeza de que mais cedo ou mais tarde algum problema iria nos atormentar. Além dos péssimos predicados, meu pai possuía um fusca, com características bastante peculiares no qual, infelizmente, viajei por um bom tempo.
    Era um Fusca de 79, com pneus carecas, direção dura, poltronas úmidas e desconfortáveis, chão mal forrado, teto com capa rasgada e visivelmente manchada, pequenas janelas trincadas, cintos enroscados, rádio estragado, câmbio de marcha meio travado, ferrugem nas laterais, pára-choque amassado, step em mal estado e entre outras características que vez ou outra impregnavam a lataria. Apesar de tudo, meu pai amava seu fusca. Mas não o amava por ser um apaixonado por carros, apenas o amava por ser uma sucata mais econômica, além do mais não media esforços para concertar o seu “carro”. Para ele, se o veículo se movimentasse de uma ponta a outra estava em ótimas condições de realizar quaisquer viagens.
    Foi nas condições anteriores que tivemos que viajar a Santo Antônio da Alegria, uma pequena cidade com um pouco mais de três mil habitantes, para o aniversário do meu tio na casa da família de sua esposa, minha querida Tia. Por mais incrível que possa parecer tudo correu bem na ensolarada viajem de Uberaba a Santo Antônio. A festa foi ótima e até mesmo meu irmão e eu, que não fazíamos aniversário, ganhamos presentes.
   Parece que o belo dia se entristeceu com algo, e fechou a cara, dando lugar a nuvens carregadas e chorosas na nossa volta a Uberaba. Enquanto viajávamos em um fusquinha apertado e em péssimas condições de suportar quatro pessoas em um só veículo, observávamos a chuva torrencial que castigava a paisagem. Repentinamente senti algo frio e úmido subindo pelos meus pés. Pensei ser um dos sintomas do frio proveniente da forte chuva. Enganei-me.
    -Mami!!! O carro tá inundando!!!
    -Meu Deus, não pode ser!!! Maurício para o carro!!!!
    -Parar o carro???!!! Vocês só podem estar de brincadeira!!! Vão ter que esperar.
    O carro começou a inundar, porém apenas a parte de trás do carro foi invadida pela água, onde meu irmão e eu estávamos. O chão, sujo de papéis de chicletes “Trident” e jornais religiosos agora subia pelos nossos pés, encharcando nossos sapatos e meias. A solução foi cruzarmos as pernas e esperarmos que aquela água suja, saísse com o tempo. Foi horrível. Não podíamos abrir a janela por causa da forte chuva e por essa razão tivemos que suportar o cheiro de podridão proveniente da mistura de água e lixo dentro do “Tietê móvel”.
      A chuva se tornou mais amena e rapidamente encontramos um posto de conveniência a beira da estrada. Estacionamos a sucata ambulante e saímos do suposto “carro” apressadamente para começarmos uma busca por baldes ao redor do posto. Encontramos um ou dois baldes e começamos a retirar a água, já de cor turva. Em pouco tempo colocamos o pé na estrada e no piso do fusca, que apesar de não estar encharcado de água, continuava a exalar o mesmo cheiro de podridão.
     A cada quilometro rodado mais perto de Uberaba, a nossa felicidade era maior. Não havia mais nada que pudesse dar errado, apesar de que o fusca, o qual estava em péssimas condições, emitia sons e remexia sua lataria nos levando a pensar que o pior poderia acontecer.
     A noite dominou a estrada assim como nossa felicidade dominou os últimos momentos da viajem. A placa de “Bem Vindos a Uberaba” estava a poucos metros. Quando o carro se preparava para passar abaixo da placa, o impossível aconteceu:
    -Papi, porque você parou o carro?
    -Eu não parei o carro. Acabou a gasolina – disse meu pai entre gargalhadas
    -O que?? Gasolina acabou??? De noite?? Agora!!!???
    -É, e os ladrões, bichos do mato, e leões da Ásia Ocidental vão te pegar!!!! – Dizia o meu pai ao som de suas risadas sádicas.
   Como éramos pequenos, infantis e inocentes o modo como expressaríamos nossa dor e revolta seria chorando. E foi o que aconteceu. De um lado dois meninos chorosos, do outro uma mãe desesperada tentando entender o que havia acontecido e apaziguar a situação, do outro um pai que a cada segundo que passava, fazia o grande favor de alimentar os nossos medos em uma noite escura, no meio de uma estrada ao lado de um alto matagal pouco iluminado.
     A solução foi pedir ajuda. Mas meu pai pediu ajuda ao meu avô paterno que na época contava com 80 anos e velocidade não era seu forte. Uma hora de sofrimento e espera até que me avô aparecesse com um galão de gasolina. Finalmente pude ir para minha casa e repousar meu corpo em minha pequena e aconchegante cama além de rezar para que no dia seguinte, os desastres do dia anterior fossem esquecidos.
     Hoje o meu pai raramente usa de seu velho fusca, pois, há pouco tempo atrás, por exigência de seus filhos e de sua ex-esposa, foi obrigado a trocar de carro. Mudou de carro, mas o pão durismo ficou. Comprou um Fiat Uno Mile que em menos de uma semana apareceu com um amassado no pára-choque, retrovisor quebrado e maçaneta da porta direita estragada. E concertou? Não, pois ele ainda se movimenta, ou seja, é desnecessário o seu concerto, porém, tudo o que meu pai utiliza em seu dia a dia, mais cedo ou mais tarde se torna inutilizável, estragado ou em péssimas condições, assim como aconteceu com o Fusca.
     Herbie de “Herbie: Meu fusca turbinado” ganharia um bom cachê dando palestras de “Como cuidar do seu carro” aqui em Uberaba, para pessoas como meu pai. Ensinar idéias óbvias às massas populacionais pode gerar um bom dinheiro. Vamos fazer negócio Fusquinha?

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Controle nada absoluto

    -E ai Pachón? Vai beber o quê?
    -Vai uma Swhweppes mesmo...
   -Tá de brincadeira né? É final de semana!!! Vai uma bebida mais forte ai...
   -Cara nem bebo. Nunca bebi nada alcoólico, porque nem curto beber.
    Bebidas alcoólicas nunca me interessaram. Nunca tomei um gole e, provavelmente, não irei me aventurar a experimentar. Meus parentes e amigos já me ofereceram um trago, porém recusei. Das pessoas que bebem, não penso nada. Não discrimino ninguém por beber. Se fosse o caso, já teria me afastado de bons e velhos amigos. O fato de me recusar a beber, não se deve a pensamentos preconceituosos e nem a ser bem sucedido ao ingerir bebidas alcoólicas, mas sim a uma pequena, porém significativa experiência que tive quando pequeno.
    Era aniversário do meu bisavô. Fazia exatamente 100 anos de idade que o Senhor Ferrucio, ou vovô Ucho, como costumávamos chamá-lo, veio ao mundo. Meu irmão e eu não tínhamos muito contato com ele, além do mais ele residia em Sacramento, onde a maioria da minha família paterna, também morava. (E ainda mora.) Mas pouco contato, não era desculpa para não irmos à festa do Vô Ucho. Além do mais, não é todo dia que uma pessoa faz 100 anos de idade.
    Quando chegamos até Sacramento, estava chuvendo. Vô Ucho estava sentado em sua pequena cadeira de balanço recebendo a todos com um grande sorriso, dando um grande e apertado abraço e ainda raspando sua grisalha, porém pontiaguda barba em nossos rostos. Todos os parentes estavam presentes além de meus bons e velhos primos. Sua casa era antiga, porém de grandes proporções. Ao fundo, em uma pequena varanda, havia pequenos papagaios que ao som de “Loro!!!, Loro!!!” voavam em seu ombro. No mesmo local havia um pequeno tanque cheio d’água, sem muita utilidade.  A festa prometia. Muita comida, e muita bebida. Principalmente bebida alcoólica. Meus tios aproveitaram e começaram a “encher o tanque”.
    Algumas horas se passaram. Meu irmão e eu jogávamos com os primos. Minhas tias e meus primos mais velhos jogavam buraco juntamente com o meu Vô Ucho. Tudo estava correndo...
    -Ahhhhhhhhh!!!!! Tá na hora de tacar todo mundo no tanque!!!!!!! Quem vai ser primeiro???!!!! Já sei !! Vem cá minha querida Tia M. você vai ser a primeira!!!!
     -Não !!!!! Para, não faz isso, por favor !!!!
     -Agora mesmo vão ser vocês meninos!!!!
    Meu irmão, eu e meus primos, nos entreolhamos sem saber o que fazer. Primeiro iriam encharcar as mulheres para depois fazerem o mesmo com as crianças. A solução mais eficiente que encontramos foi nos escondermos em um pequeno quarto juntamente com minha mãe e minha outra tia. Da janela podíamos ver a forte chuva a qual estava causando uma grande enxurrada. Aproveitando a água, visivelmente suja, que corria pelo passeio, meus tios, visivelmente bêbados, resolveram colocar o cabelo da minha tia na enxurrada. Fiquei assustado. Meus tios riam incessantemente enquanto minha tia gritava aos montes. Pra mim não fazia sentido. Como uma bebida pode mudar tanto uma pessoa? Porque eles estavam agindo assim? Será que eu vou ser assim quando crescer?
    Meus pensamentos foram interrompidos por fortes batidas na porta do quarto no qual nos escondemos. Meus tios gritavam perguntando quem estava dentro do quarto. Não respondíamos. Tentavam abrir a porta, porém nós a tínhamos trancado com chave. Eles desistiram. O tempo passou, e percebemos que a calmaria dominou a casa. Resolvemos sair.
    Tudo estava calmo demais. Minha Tia, que foi a primeira vítima das peripécias dos meus tios, tomava banho, tentando lavar o cabelo, todo sujo pela enxurrada. Resolvi ver onde estavam meus tios para saber se o local estava seguro. Não os encontrei. Porém, eles estavam escondidos...
    -Ahhhhhhh!!!! Peguei o Bernardo!!!!!
    -Não!!!! De onde você saiu!!!!! Me coloca no chão!!!! Mami me ajuda, por favor!!!!!
    -Por favor, coloca meu filho no chão!!!!
    -Calma!!!! Não vai acontecer nada!!
    -Me solta!!!! Por... Por... Favor...
    Comecei a chorar e a gritar de forma compulsiva. Meu tio me levava para o tanque cheio de água, nos fundos do quintal. Não sabia nadar, e a água estava suja. Chegando a poucos metros do tanque, meu tio me balançava em seus braços enquanto ria sadicamente, me ameaçando jogar no tanque. Minha mãe interveio a tempo e me tirou dos braços do meu tio.
   Infelizmente, a cena anterior ficou marcada. Como disse não sou contra quem bebe. Na verdade parabenizo aqueles que conseguem beber sem perder o controle, sem sair de si. Não me aventuro a experimentar porque tenho medo de bebida, mas sim, porque tenho medo do que a bebida pode fazer comigo. Eu prezo pelo controle absoluto. Sei que um gole não vai me deixar bêbado, mas, como acontece com todos os prazeres, sendo eles ruins ou bons, quem experimenta uma vez, sempre vai à procura de mais.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Atividade Paranormal

    A maioria das pessoas, em sua inocência, tinham medo de certas coisas que hoje não vemos motivo algum para nos apavorarmos, ou até mesmo não entendemos o porquê daquele medo sem sentido. Enquanto a maioria das crianças tinham medo de escuro, palhaços, altura, ou qualquer outro tipo de medo que uma criança geralmente tem, eu tinha medo de poste. Sim, isso mesmo que você leu. Eu tinha medo de poste, poste de luz, poste sem luz ou simplesmente um poste. Esse medo só aparecia quando passeávamos a pé. Se viajássemos ou passeássemos de carro esse medo não se manifestava.   
    -Mira Bernardo, los pajaritos, mira que bonito el cielo, no es bonito!?... (Olha Bernardo, os passarinhos, olha que bonito o céu, não é bonito!?..).
    -POSTE !!!! Ahhhhhhhhhhhh !!!! Mami, me ajuda...Uehhhhhhhh!!!! Uehhhhhhhhhh!!!!
    -Acarmate hijo mio !!!!! Lo que tu tiene ? Porque esse miedo todo?  Tu quiere veni em brazo de mami? (Meu filho, se acalma!!!! O que você tem? Porque esse medo todo? Você quer o colo da mamãe?).      
     -Uehhhhhhhh!!!! Uehhhhhhhhhh!!!! Uehhhhhhhh!!!! Uehhhhhhhhhh!!!! Uehhhhhhhh!!!! Uehhhhhhhhhh!!!!
    Se para vocês, caros leitores, essa cena escrita já é irritante e cansativa imagine quando essa situação realmente ocorria. Infelizmente até hoje não consegui descobrir o porquê desse medo sem sentido. Minha mãe me pedia para que eu explicasse o porquê de tanto pavor e eu apenas chorava ou então quando essa situação não ocorria, ela me pedia uma explicação e eu pedia a ela, já meio choroso, que não tocasse no assunto. Minha mãe, quando eu não queria algo, ela não forçava a barra, apenas me dava um grande abraço e um beijo. O seu jeito carinhoso e compreensivo sempre fez com que meu irmão e eu fossemos mais próximos a ela. Diferentemente do que ocorreu com meu pai.
    Quando esse medo vinha à tona e meu pai estava presente, o medo se tornava maior. Meu pai me forçava a abraçar o poste. Talvez vocês digam: “Mas você precisava enfrentar seu medo.” Vocês disseram muito bem. Eu é que deveria enfrentar esse medo, e não alguém me forçar a enfrentá-lo, pois naquele momento eu não estava preparado. Era uma cena engraçada. Eu correndo do meu pai pela praça e minha mãe dizendo: “M. deixa o menino!!!! Não faz isso com ele!!! Ele tá chorando muito!!!!”, mas meu pai não a escutava, ou então fingia que não a escutava, pois achava que o método da minha mãe era muito falho. As pessoas olhavam assustadas, e não se aventuravam a perguntar o que estava acontecendo. Porém, um dia, uma pessoa infelizmente se manifestou.
    Viajávamos para Peirópolis, ou como eu costumava chamar, “A casinha dos dinossauros”. Na época eu amava ver esses répteis pré-históricos. Era fissurado. Tinha livros sobre eles e brinquedos (Ainda inteiros) de alguns desses répteis. Amava correr e abraçar aquele enorme dinossauro no meio do sítio, porém se houvesse algum poste por perto, nem dinossauro me acalmava. Em uma dessas ocasiões, quando meu pai corria atrás de mim para me forçar a abraçar um dos postes em Peirópolis, uma senhora de meia idade veio ao encontro de minha mãe, e disse o seguinte:
    -Esse é o seu filho!?
    -É sim, meu filho sim... Por quê?
    -Meu Deus, tenho pena de você...seu filho precisa de ajuda.
    -Ajuda? Isso é só um medo que quando crescer passa...
    -Não!!!! Seu filho está possuído minha senhora!!!!
   -Possuído!? Que idiotice é essa? Não acha que está exagerando demais??
  -Seu filho vai destruir sua família quando a senhora menos esperar!!! Vai matar a todos!!!
    Meu pai e eu paramos até de correr para observar a cena. Minha mãe não esperou nem mais um minuto, rapidamente me pegou no colo e saímos acelerados de Peirópolis. Graças a Deus, essa senhora estava errada. Eu não estava endemoniado, além do mais não matei ninguém. Acho que a cena que presenciamos em Peirópolis foi tão atípica que eu nunca mais apresentei medo por postes. Hoje em dia tento imaginar o slogan de trabalho dessa senhora, se é que ainda está viva. Deve estar por ai tentando lucrar com sua psicologia extremamente construtiva.
     "Ei você.Tem medo de alguma coisa estranha? Então se trate de forma mais estranha ainda!!!! Chame a Senhora Amornada. Acaba com seu medo e te dá um trauma de senhoras de meia-idade. Número para contato: 6666-6666. Atendimento 24h."

domingo, 12 de fevereiro de 2012

O aprendiz de Isaac Newton

    Quando pequeno um dos dias mais empolgantes da semana para meu irmão e eu era o domingo. Era o dia do presente. Não importava se era data comemorativa ou não, nós sempre ganhávamos um presente, no mínimo um Kinder Ovo (Tinha a má sorte de, no meu ovinho sempre sair um quebra cabeça...), mas recebíamos presentes de apenas uma pessoa. Dona H., a minha avó paterna. Era nosso Papai Noel feminino de todos os domingos. Carrinhos de controle remoto, Helicópteros de controle remoto, carrinhos Hotwheels, caminhões, bolas, cordas de pular, quebra cabeças e uma infinidade de brinquedos os quais tinham uma vida útil muito pequena em nossas mãos, principalmente, em minhas mãos.
    Nossa casa estava se tornando uma loja de brinquedos estragados. Tudo com o qual eu brincava, estragava em poucos minutos. Mas também não era para menos. Todo brinquedo em minhas mãos se tornava um projétil, um foguete da Nasa, um OVNI. Queria que todo e qualquer brinquedo voasse (Na verdade queria que qualquer coisa voasse). Os jogava para cima e observava sua trajetória. Era lindo quando voava, mas horrível quando caia, pois se espatifava em pedaços no chão, ou arranhava o carro de um vizinho rabugento ou, como já disse em uma crônica anterior, acertava a cabeça de parentes, amigos e familiares.
    Em meu prédio, existe um lugar que chamamos de sacada, onde você tem uma vista da vizinhança e do restante do prédio. Nesta sacada minha mãe colocou uma rede de proteção. Como eu era um menino muito ativo eu não controlava meus instintos coloquei meu plano inconseqüente em ação. Escondido, peguei uma tesoura sem ponta (Que eu usava na escola) e cortei a parte direita da rede, um local que minha mãe não poderia me enxergar por causa de uma pequena parede. Comecei a pegar os brinquedos disfarçadamente, pois para ir para a sacada precisa de passar pela sala na qual minha mãe estava. Quando passava pela sala fingia que estava brincando com o brinquedo, mas quando entrava na sacada, os jogava pelo buraco em um pequeno arbusto localizado no térreo, bem abaixo da sacada e me escondia para que ninguém me visse. Porém muitos dos brinquedos se desviavam da trajetória e ou batiam em carros ou quase acertavam em pessoas. Nesse momento um carro se preparava para estacionar e tento imaginar o que o motorista disse a sua acompanhante...
    -Amor, você sabe qual vai ser a previsão do tempo hoje?
    -Parece que vai chuver...
  -Já tá chuvendo...Chuvendo raquetes de tênis, carrinhos, bolas, pedaços de corda, caminhões de plástico com uma pitada de pilhas extra grandes...
    Nesse momento todo o prédio observava a cena, incluindo minha mãe:
    -Bernardo ???
    -Mami!!! Ah.... Você viu? Eu sem querer deixei cair meu brinquedo...
   -É eu vi como esse e todos os seus brinquedos caíram sem querer e como esse buraco se formou sem querer...
    A única coisa que eu sei é que a última coisa que caiu abaixo foi a minha calça, para receber uma boa de uma chinelada. Mais tarde todos os meus brinquedos vieram em uma caixa de volta para mim (Todos em partes). Todo o prédio ficou decepcionado comigo incluindo, obviamente, a minha mãe. Mas existe uma pessoa que me daria os parabéns por ter testado incansavelmente sua teoria com objetos inimagináveis. Você foi um ótimo mestre, Issac Newton. Espero que tenha sido um ótimo aprendiz, pois fiz tudo pela ciência até mesmo acabei com o carro do vizinho... Quem quer ser a próxima vítima?      

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Filho de peixe, nem sempre peixinho é

Pelas injustiças cometidas, pelos momentos de exasperação quando criança (De minha parte, é claro), dedico esta crônica ao meu velho e grande amigo, A.L.
    -Vamos niño!!!! Tu tiene que ir para la escuela!!! (Vamos goroto!!! Você tem que ir para a escola!!!).
    -Estoy iendo, abuelita!!!! (Estou indo vovó!!!).
    Eram raros os momentos em que meus avôs me levavam a aula, mas a ocasião pedia um pouco de improviso, além do mais, minha mãe estava com uma carga horária bem apertada no local de trabalho. Eram as primeiras semanas de aula do meu primeiro ano no Colégio Z. Animação era uma palavra muito pequena comparada com o que eu estava sentindo ao ter que comparecer todos os dias a aula.
    -Mira, tu tiene que comportarte porque mami no gusta de niño revoltoso, hein?? Y nim abuelita. (Olha, você tem que se comportar, porque sua mãe não gosta de menino bagunceiro, hein?? E nem a vovó).
    -Puede dejar abuelita. Tchau!!! (Pode deixar vovó. Tchau!!!)
    A professora E. se posicionava todos os dias na frente da porta com toda a turma. Filas indianas a estibordo e a bombordo. Meninos do lado direito, meninas do lado esquerdo. Eu me posicionei, obviamente, ao lado direito e ao lado direito da fila masculina havia (E ainda há) uma pequena fonte decorativa com pequenos peixes, muito bonita por sinal. Mas 5 minutos depois se tornou horrorosa...
    Fui jogado na fonte. Como eu era muito baixo, a pequena fonte decorativa se tornou uma piscina agonizante na qual eu emergia e submergia desesperadamente. De lá pude ver e ouvir a agonia e os gritos de minha vó, a qual estava esperando que eu entrasse em sala de aula, além de ver rapidamente as feições de sustos de colegas e da professora.
    Um disciplinário, que por ali passava, me retirou rapidamente da fonte. Levaram-me ao banheiro para uma troca de roupa e me impediram de ir embora. Fui obrigado a assistir a aula envolto em uma toalha, pois eu ainda não estava totalmente seco. Se eu pude assistir à aula toda, A.L., um velho amigo, não teve a mesma sorte. Passou parte do dia na diretoria. Acusado injustamente de me jogar na fonte, A.L., em seus primeiros dias de aula, foi levado, pela primeira vez, à diretoria.
    Algum tempo atrás, eu pedi desculpas a ele. Além do mais ele começou o ano escolar com o pé esquerdo, obviamente não por opção e sim por minha culpa. Porém, quem o conhece sabe que, muito de bom aconteceu a ele, e esse acontecimento não mudou seu senso de humor irreverente e seu amor pelos amigos.
    Quando tento entender de onde herdei tanto azar lembro-me do meu pai. Meu pai sempre foi muito desastrado e azarado. Geralmente ele mais atrapalhava do que ajudava (Até hoje). Mas em relação a contrair genes eu tenho certeza que durante minha vida escolar o azar me perseguiu. Filho de peixe, peixinho é. Mas isso se deve talvez pelo fato de não saber que eu poderia ditar minhas próprias regras e não ficar vivendo na sombra do azar. Ainda bem que nós é que fazemos a nossa sorte e não dependemos de genes para ditar o que somos, porque, na verdade, Filho de peixe, nem sempre peixinho é.        

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Hotwheels faz mal a saúde

   
    -E ai Bernardo? O que você vai escolher
    -Carrinho Hotwheels!!
    -De novo !?
    -É... e qual o problema?
    245. Esse foi o número de carrinhos da marca Hotwheels que meu irmão e eu acumulamos durante minha infância. Até hoje, esse foi meu único e verdadeiro hobby. Tios, pai, mãe, amigos e entre outros, colaboraram para aumentar essa horripilante frota de carrinhos os quais ficavam a maior parte do tempo espalhados pela sala ou voando, se preparando para acertar a cabeça de algum tio desatento. Porém, infelizmente, alguns desses carrinhos me deram um pouco de dor e sofrimento...
    -Feliz Natal, sobrinho querido!!!! Espero que goste !!
    -Hotwheels!!! Você me deu um montão deles!! Brigadão Tito (“Tio” em espanhol)
    Não conseguia deixá-los de lado. Não os soltava. Nem ao menos para comer. Os segurava no colo com as duas mãos. Eram meus preciosos... Na hora de irmos para nossa casa minha mãe se ofereceu para levar parte da carga até chegarmos ao carro, mas eu recusei. Foi uma pena. Um pequeno,porém significante tropeço me fez cair no pedregoso passeio em que andava, machucando a parte superior da mão direita.
    Nada mais importava. Chorava descompassivamente. Nem ao menos me lembrei de recolher os carrinhos caídos na calçada, que por sinal estavam intactos. Apenas me importava com o machucado. Minha mãe me acalmava enquanto recolhia os carrinhos e logo adormeci no banco do carro. O incidente me fez concluir que Hotwheels faz mal a saúde, mas como diria um fumante, eu sei que isso pode me fazer mal, mas mesmo assim continuo usando porque me faz bem.
    Algumas pessoas que convivem comigo já devem ter percebido que tenho uma mancha na parte superior da mão direita. O motivo dessa mancha eu acabo de revelar na história acima. Antes de contar esta história muitos já tentaram adivinhar o motivo dessa mancha, mas nada se compara ao comentário de um menino que me viu andando alguns dias atrás...
    -Mãe!!! Olha aquilo na mão daquele garoto!!!
    -Nossa o que é aquilo?
    -Eu acho que é câncer de pele!!!! Vamos sair daqui!! Pode ser contagioso!!!!